“BRASILEIRO É TÃO BONZINHO” (Kate Lira)
Por
Fernando Carvalho autor de “Açúcar o perigo doce”, editora Alaúde.
E administrador deste blog.
Na revista
Veja de 20/04/2013, a escritora Lya Luft tratou da violência nossa de cada dia.
Para quem não sabe o Brasil é um dos países mais violentos do mundo, aqui morre muito
mais gente vítimas de armas de fogo que na Síria, atualmente em guerra civil.
Lya chamou a atenção para a epidemia de violência, os arrastões nos
restaurantes de São Paulo (no Rio é em túneis e engarrafamentos), a onda de
violência que invade nossas casas, apartamentos e sítios. E a exuberância
irracional da violência: menores de idade que já saem de casa “com vontade de
matar”. E não só matam: estupram, violentam, chacinam inocentes. “O crime se
tornou banal, a vida vale quase nada” arremata Lya. Jovens assaltantes atearam fogo a uma
dentista porque ela não tinha dinheiro.
Infelizmente
o diagnóstico de Lya é parcial, focaliza apenas a violência dirigida à classe
média que diante da violência se esconde atrás das grades que cercam os
edifícios onde moram, dos arames farpados e cercas eletrificadas que adornam os
muros altos que cercam suas propriedades e dos carros blindados.
No que diz
respeito à violência brasileira, o buraco é mais embaixo. A meu ver, a
violência que respinga na classe média é decorrência da que se abate sobre as
classes subalternas. O fogo que imolou a dentista que não tinha dinheiro para
os assaltantes é o mesmo que esturricou o índio Galdino de Jesus em Brasília,
fogo colocado por jovens de classe média, um deles filho de um juiz de direito.
É o mesmo fogo que carboniza mendigos e habitantes da rua Brasil afora.
Violência que tem até um lado “mudo”, a prefeitura do Rio de Janeiro retirou os
bancos dos pontos de ônibus e não tem colocado bancos nas praças novas ou nas
que são restauradas. Mendigos e moradores de rua não possuem o direito nem de
descansar ou dormir num banco de praça. Essa violência silenciosa (que respinga nos idosos que ficaram sem ter onde sentar)
não seria um convite à violência gritante
contra os pobres?
Lya Luft
reclama contra a responsabilidade criminal aplicável apenas após dezoito anos
completos e lembra que em países civilizados como Canadá e Holanda é de doze
anos. Reclama de não poder chamar de “assassinos” esses pimpolhos de 15 anos. “Jovens monstros, assassinos frios, sem
remorso, drogados ou simplesmente psicopatas (que) saem para matar e depois vão
beber no bar, jogar na lan house, curtir o Facebook, com cara de bons meninos”.
E faz um desabafo dramático: “Hoje a
população, apavorada, está nas mãos de criminosos”. E conclui quase
clamando por uma solução, quase exortando as autoridades a apresentarem uma
solução: “Estamos indefesos e apavorados,
nas mãos do acaso. Até quando?”.
Lya há
algum tempo se indispôs com os ecologistas por causa das baleias, pelo fato
dela dizer que se emocionava com gente e não com os enormes mamíferos dos
mares. Lya também durante o plebiscito do desarmamento votou favoravelmente ao
comércio de armas. Desses precedentes concluí que entre gente e bichos ela
prefere gente, mas entre gente e a propriedade privada ela, pequeno-burguesa,
prefere a propriedade.
É
lamentável que Lya Luft esteja tão obnubilada pelo medo que toma conta da
classe média. Não se pode colocar no mesmo saco assassinos, drogados e
psicopatas. De nada vai adiantar encher as cadeias com meninos de 12 anos.
Lya Luft
não escreveu nem uma linha sobre o caldo de cultura que alimenta a violência
brasileira, a moldura social na qual se move o povo brasileiro, fatores que
levam uma mulher a jogar um bebê no lixo. E os sobreviventes são empurrados pela
vida para a cracolândia.
O Brasil é
uma fábrica de doentes e marginais. Se nossa infância e juventude fossem
educadas com base numa paidéia no
sentido grego antigo e alimentadas com comida em vez de uma ração açucarada, a
pressão por hospitais e médicos, presídios e policiais, seria menor.
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